Dom Casmurro - Machado de Assis
Agora há pouco finalizei "Dom Casmurro".
Não sei o que há nessas tragédias, de Shakespeare e do Bruxo, em que iniciamos a obra já sabendo que frustrar-nos-emos, e fazemo-lo a leitura inda assim; por amor às personagens, talvez.
A minha conclusão é a de que não há o que se concluir. A história fora contada por Casmurro, o dito traído. Por óbvio que ela será tendenciosa. Qualquer inferência que façamos há de estar contaminada.
Demais disso, o clássico tem outros núcleos que, malgrado não recebam tanta atenção quanto o casamento de Capitu, são, outrossim brilhantes; como os casos do protonotário, e a febre por superlativos de José Dias, o agregado.
O que me cativa em Machado é a sua maestria com a Língua Portuguesa. Cada parágrafo é uma novidade, pois quase impossível prever como será a estrutura do seguinte. Estes são o deleite de se ler Assis: os versos, as ironias, a sinceridade.
Para encerrarmos, deixo aqui o meu excerto favorito da obra (que assim o é em razão do icônico jogo de palavras, que provavelmente poeta algum seria capaz de reproduzir).
A cena se passa quando Bentinho e Capitu ainda são crianças, vivenciando os primeiros fôlegos do amor, num beco às escuras, escondidos dos pais:
"Voltei-me para ela; Capitu tinha os olhos no chão. Ergueu-os logo, devagar, e ficamos a olhar um para o outro... Confissão de crianças, tu valias bem duas ou três páginas, mas quero ser poupado. Em verdade, não falamos nada; o muro falou por nós. Não nos movemos, as mãos é que se estenderam pouco a pouco, todas quatro, pegando-se, apertando-se, fundindo-se. Não marquei a hora exata daquele gesto. Devia tê-la marcado; sinto a falta de uma nota escrita naquela mesma noite, e que eu poria aqui com os erros de ortografia que trouxesse, mas não traria nenhum, tal era a diferença entre o estudante e o adolescente. Conhecia as regras do escrever, sem suspeitar as do amar; tinha orgias de latim e era virgem de mulheres."